quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Devaneios errantes

    Para ser grande, sê inteiro: nada
    Teu exagera ou exclui.
    Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
    No mínimo que fazes.
    Assim em cada lago a lua toda
    Brilha, porque alta vive.

    Ricardo Reis, 14-2-1933

    Tudo quanto penso,
    Tudo quanto sou
    É um deserto imenso
    Onde nem eu estou.

    Extensão parada
    Sem nada a estar ali,
    Areia peneirada
    Vou dar-lhe a ferroada
    Da vida que vivi.

    [...]

    Fernando Pessoa, 18-3-1935

Sempre o depois, mas o importante vem entre....

Se depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia,
Não há nada mais simples.
Tem só duas datas - a da minha nascença e a da minha morte.
Entre uma e outra todos os dias são meus.
Fernando Pessoa/Alberto Caeiro; Poemas Inconjuntos; Escrito entre 1913-15; Publicado em Atena nº 5, Fevereiro de 1925

Apenas ser poeta

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega fingir que é dor
A dor que deveras sente.
Fernando Pessoa/Bernardo Soares; Autopsicografia; Publicado em 1 de Abril de 1931

Sucedidos sim, nunca substituíveis


Ser, Sim um Ser Insubstituível
Arnaldo Pereira Ribeiro

Há os que dizem que ninguém é insubstituível.
Que quando chega, a morte nos apaga e apaga nossos rastros
mais cedo ou mais tarde.
Nossa condição de ser insubstituível prevalece por pouco tempo
e nos tornamos apenas reproduções de som e imagem,
ou palavras mortas sobre o papel ou sobre a pedra,
nos livros de história, nos museus.
Quando desaparecemos, o que fazíamos poderá ser feito por outros,
o que dizíamos poderá ser dito por outros.
Pronto, tudo resolvido.
A vida continua, o mundo continua a girar.
Verdade?
Mentira.
Não há dois dias iguais.
Um sucede o outro, mas não o substitui.
Porque cada dia é único.

Assim como na sinfonia, onde uma nota sucede outra,
mas não a substitui, sempre seremos sucedidos
nunca substituídos.
Porque nossa vida é única.
Porque cada pessoa é única.
Porque tudo o que geramos revela a nossa autoria,
como se fosse assim uma espécie de marca.
Indelével, singular.
Um filho, um livro, um quadro, uma idéia,
um sentimento, uma palavra.

"Cada um de nós pode ser insubstituível.
Ser insubstituível, sim, por que não?
Um ser insubstituível não por arrogância,
nem por posses, nem por dotes físicos ou intelectuais.
Ser um insubstituível ser, simplesmente pelas emoções criadas
e pelos valores agregados em sua volta.
Ser um insubstituível seja pela renúncia à mediocridade,
pela fuga do vazio, pelo abandono da irrelevância.
Poderíamos ser todos insubstituíveis seres,
pela energia positiva que transmitimos às outras pessoas,
pela vibração produzida por nossos sentimentos,
pelos nossos exemplos e atitudes, pelo nosso esforço admirável
de passar por esta vida deixando marcas de excelência,
como se fossem rastros de luz.
Sejamos todos insubstituiveis.
Eu para você e você para mim.
Uns para os outros. Cada um para todos."

Abraços clássicos

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Give me

Vinícius de Morais, sempre Vinícius

O Haver


Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura
Essa intimidade perfeita com o silêncio
Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo
- Perdoai! eles não têm culpa de ter nascido...

Resta esse antigo respeito pela noite, esse falar baixo
Essa mão que tacteia antes de ter, esse medo
De ferir tocando, essa forte mão de homem
Cheia de mansidão para com tudo que existe.

Resta essa imobilidade, essa economia de gestos
Essa inércia cada vez maior diante do Infinito
Essa gagueira infantil de quem quer balbuciar o inexprimível
Essa irredutível recusa à poesia não vivida.

Resta essa comunhão com os sons, esse sentimento
Da matéria em repouso, essa angústia da simultaneidade
Do tempo, essa lenta decomposição poética
Em busca de uma só vida, uma só morte, um só Vinicius.

Resta esse coração queimando como um círio
Numa catedral em ruínas, essa tristeza
Diante do quotidiano; ou essa súbita alegria
Ao ouvir na madrugada passos que se perdem sem memória.

Resta essa vontade de chorar diante da beleza
Essa cólera cega em face da injustiça e do mal-entendido
Essa imensa piedade de si mesmo, essa imensa
Piedade de sua inútil poesia e de sua força inútil.

Resta esse sentimento da infância subitamente desentranhado
De pequenos absurdos, essa tola capacidade
De rir à toa, esse ridículo desejo de ser útil
E essa coragem de comprometer-se sem necessidade.

Resta essa distracção, essa disponibilidade, essa vagueza
De quem sabe que tudo já foi como será e virá a ser
E ao mesmo tempo esse desejo de servir, essa
Contemporaneidade com o amanhã dos que não têm ontem nem hoje.

Resta essa faculdade incoercível de sonhar
De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade
De aceitá-la tal como é, e essa visão
Ampla dos acontecimentos, e essa impressionante.

E desnecessária presciência, e essa memória anterior
De mundos inexistentes, e esse heroísmo
Estático, e essa pequenina luz indecifrável
A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.

Resta essa obstinação em não fugir do labirinto
Na busca desesperada de uma porta quem sabe inexistente
E essa coragem indizível diante do grande medo
E ao mesmo tempo esse terrível medo de renascer dentro da treva.

Resta esse desejo de sentir-se igual a todos
De reflectir-se em olhares sem curiosidade e sem história
Resta essa pobreza intrínseca, esse orgulho, essa vaidade
De não querer ser príncipe senão do seu reino.

Resta essa fidelidade à mulher e ao seu tormento
Esse abandono sem remissão à sua voragem insaciável
Resta esse eterno morrer na cruz de seus braços
E esse eterno ressuscitar para ser recrucificado.

Resta esse diálogo quotidiano com a morte, esse fascínio
Pelo momento a vir, quando, emocionada
Ela virá me abrir a porta como uma velha amante
Sem saber que é a minha mais nova namorada.


Conheça a vida e a obra do autor em "Biografias".

Doces ou travessuras

sábado, 23 de fevereiro de 2008

Um tempo ao vento


Desejos são engraçados, vontades são aviltantes aos olhos do outro...
Olhamos...
Quem somos?
Parte de um todo no meio do nada...
Vazio?
Não, até na matemática o conjunto vazio tem subconjunto, sui generis ...
O tempo muda-nos, sem que se aperceba, pessoas vem e vão, amores entram e saem,
Dores intensificam e atenuam-se, uma dicotomia evidente,
na efemeridade dos acontecimentos,
um dia, uma tarde, uma noite, o sol, a lua,
"amo la vita meravigliosa"...
Seria hipócrita, se dissesse que sou feliz hoje,
neste instante,
acho que um misto de felizes instantes,
porque as pessoas enganam, mentem, iludem, usam???
Até nos mesmos fazemos isto connosco...
Sei responder em parte, umas sem perceber que o fazem, outras intencionalmente,
Quanto a usar, isto faz parte, mas um usar sem denegrir, agredir, uma troca,
um escambo, para amarmos sempre desejamos ser amados, é um tipo de usar, de troca,
condição...
Ai pergunto-me pela minha segurança emocional...
Onde estão minhas bonecas, meus peluches, meu medo de escuro ou de olhar debaixo da cama, de "pintinhos" (os filhotes da galinha...hehhehe), meus sonhos de infância, meu colinho na casa da avó, o jeito importante de me olhar do meu avô que deixava-me orgulhosa por apenas existir (de facto "basta existir para ser completo", mas ainda procuro minha existência algures)
meus discos para dançar a frente do espelho solita, belo, belíssima época...
Quero encontrar-me, aceitar minhas imperfeições e o facto de não poder vencer sempre, não ser referência para quem amo.
Quando era bem miúda apaixonei-me por um rapaz do secundário, e nos meus planos ele era meu namorado e sempre brincava, que eu o namorava mas o dia que ele descobrisse terminava comigo, isto era mesmo a pessoa, maluquinha, tola da ideias....
Este foi um entre tantos momentos significativos, não choro por perder, mas pela forma como as vezes não encontro forças para lutar, os improvisos, o plano B, como diz a gestão estratégica, sei tanta teoria, que as vezes na prática perco-me no espaço....
São os risco de viver...

Gente

Meravigliosa Creatura

Gianna Nannini

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Molti mari e fiumi
attraverserò,
dentro la tua terra
mi ritroverai.
Turbini e tempeste
io cavalcerò,
volerò tra i fulmini
per averti.
Meravigliosa creatura,
sei sola al mondo,
meravigliosa paura
di averti accanto,
occhi di sole
bruciano in mezzo al cuore
amo la vita meravigliosa.
Luce dei miei occhi,
brilla su di me,
voglio mille lune
per accarezzarti.
Pendo dai tuoi sogni,
veglio su di te.
Non svegliarti, non svegliarti ancora.

Meravigliosa creatura,
sei sola al mondo,
meravigliosa paura
di averti accanto.
Occhi di sole,
mi tremano le parole,
amo la vita meravigliosa.

Meravigliosa creatura,
un bacio lento,
meravigliosa paura
di averti accanto.
All’improvviso
tu scendi nel paradiso.
muoio d'amore meraviglioso