sexta-feira, 28 de março de 2008

Contos 5

"O gosto pela escrita não era recente.
Na verdade, Bela sempre gostou de expressar os seus sentimentos e emoções através das palavras.
A magia dos adjectivos, a procura do tempo verbal certo, o balanço da pontuação
e o lado metafórico das ideias constituiam para Bela a expressão da perfeição e do belo. A beleza, para ela, estava nas palavras.
Todo o resto era secundário. Desde cedo cultivara o prazer de escrever
para ela e para os outros. Os seus mais recônditos e profundos pensamentos
dava-os a conhecer através das suas palavras.
Gostava de partilhar. Sabia bem que escrevia com elevo,
num tom de sedução e encantamento. Dominava a sua língua e
tinha orgulho nisso. Sentia alguma vaidade quando, por vezes, alguém
lhe elogia alguns dos seus escritos. Tinha um dom, não havia dúvidas
disso! Por vezes, os seus textos eram densos, profundos, indo ao
âmago das questões. Outras vezes leves, denotando alegria. Não
escrevia com ligeireza e precipitação. Pensava as palavras e só
depois as vertia para o papel. Incontáveis foram as noites que no
seu pequeno quarto, com a janela entreaberta deixando entrar o
fresco da noite, escreveu belos e sentidos textos, numa tentativa de
perpetuar aquele momento e de o tornar único. Sentada de frente da
escrivaninha, no silêncio da noite, pensava no país que a acolhera e
no país que deixara para trás. Pensava na família e nos entes mais
queridos. Pensava no presente e no futuro. E escrevia em acto
contínuo e reiterado. Quando escrevia não o fazia para alguém em
particular. Os seus escritos não tinham um destinatário. No entanto,
nas últimas semanas escrevia a pensar em alguém e por vezes escrevia
para esse alguém, como num namoro, em que se dá e se recebe.
Sentia-se feliz por isso. Finalmente, os seus escritos tinham do
outro lado um rosto visível.
Alguém Especial"
Carolzita
Publicado no Recanto das Letras em 22/08/2006
Código do texto: T222906

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